terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Simples

Eu sonhei sonhos
que sonharam antes de eu nascer
Sonhei vidas
As quais nunca poderei ter
Me iludi com a falsa originalididade
Vivi num engodo de felicidade
Sobrevoei ideias do passado
Tomei-as como motivos para novos traçados
Ressaltei aquilo que nem acreditava
Passei adiante como verdade renovada
Mas não passavam de mentiras limpas
Que apenas voltavam a ilusão da vida
Descobri a verdade
Fingi não tê-la para seguir na mentira
Mas ainda estava aqui
O sonho, a mentira, a busca e o fim
Do Alvorecer ao Epitafio, são assim os dias
É assim a vida!

domingo, 21 de fevereiro de 2010

Dor de não escrever.

Num canto de papel em branco
Palavras saem sem encanto
Rimas vazias, ideias sem graça

Vontade de escrever não falta
Mas a inspiração que transforma
Inalcansável, anda tão alta

Palavras de pouco sentimento
Breves dizeres enchem o papel
São apenas marcas no cimento
Eles só vêem, mas não enxergam

Pobre escritor de versos
Sem musa, sem objeto
Espera inspiração dos ventos
Enquanto vagas ideias não passam de dejeto.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Coisas que se passam

Eu vi
No espelho do outro aquilo que não queria
Eu vi
Na vida dos outros o que procurava
Eu vi
Nos dias passados as coisas perdidas
Eu senti
Perder tudo por ficar apenas vendo
Vendo minha derrota frente a outros
Sentindo medo de perder aquilo que nunca ganhara

Fiquei perdido em pensamentos
Preso em mim mesmo sem que pudesse ver luz
Por acreditar que a luz estava aqui
Mas era apenas o fogo do egoísmo
Luz que esquentava nas horas tristes
Que me ludibriava, formando a mentira que sou
Me fazendo uma mentira da própria mentira
Construção de barro, oco, vazio, mas disfarçado por uma pele
Fraca construção
Cai com o tempo, e me infesta pela verdade
Mata-me que é melhor, ao menos não ficarei decompondo aos poucos.

sábado, 6 de fevereiro de 2010

Pandora



As engrenagens estavam secas, a lubrificação da maioria delas tinha se acabado havia anos, mesmo assim deviam girar.Os barulhos metálicos se expandiam pelo lugar, o girar seco das rodas os faziam aos montes emitindo sons que eram respondidos por barulhos iguais. Pequenos e quase invisíveis fios se desenrolavam por ali, tal como uma teia de aranha mais elaborada, encontrando-se em alguns pontos, ligando-se as engrenagens em outros, ganhando pequenos volumes disformes durante seu desenrolar lento por entre as peças de metal. Era tudo compassado e auto-suficiente, por isso a menina ficava a se balançar por horas, e dias e anos a fio sem se importar com nada. Em meio aquele tanto de fios, ela simplesmente tentava se divertir, mas o lento balançar do pêndulo nem ao menos divertia mais, era apenas algo para se passar àqueles pontos incontáveis de nada.

Antes os olhos brancos acompanhavam o desenrolar de grandes novelos, no âmago de tudo aquilo, mas se cansou dessa brincadeira e procurou achar diversão em outra atividade: amarrar coisas nos fios, como se fossem grandes varais, também era bom, mas de que valia, se a engrenagem só ficava agarrada por instantes? Logo se cansou disso também. Então achou seu lugar favorito, o balanço gélido de metal, fora divertido por algum tempo, mas agora era apenas mais um lugar. Um rangido pra lá, outro rangido pra cá, lento tal como brisas de janeiro. Os cabelos negros envolvidos na face nem se moviam, a cabeça baixa apenas esperava os momentos gloriosos de se ter paciência. Mais rangidos, menos desejos.

A menina estava inerte em seu assento nada glorioso, vestidos largados sobre o seu balanço eterno. Os fios caminhavam por entres as peças, travando suas próprias lutas contra o lugar, seguindo um caminho determinado por entre toda aquela vastidão de engrenagens secas.

Um sopro frio perpassou as vestes da menina, balançou-as de um modo único, e que ela aprendera a reconhecer. O corpo sem movimentos tomou uma alegria infindável, os olhos brilharam por debaixo dos fios negros enovelados em sua face. Um sorriso branco e maldoso apareceu. Como uma pessoa que reaprende a andar ela levantou-se, as mãos para baixo, os cabelos sobre a face como uma cortina negra para não deixar entrar luz. As pernas dobradas, um joelho virado para o outro. Soltou um suspiro gelado, colocando pra fora a fria vida que levava. Virou-se repentinamente para o lado, então o pêndulo se moveu em meio às engrenagens tempestuosas em seus barulhos repetitivos. Ela nem mesmo saiu da posição para encontrar outra mais confortável, apenas manteve-se ansiosa pelo o que vinha a frente. O pêndulo parou, o fio engrossado se fez ver emperrando uma das engrenagens. Debruçou-se sobre o fio do balanço, e moveu a mão numa pequena música particular e com um movimento, com apenas um dos dedos erguidos ordenou algo. O balanço moveu-se para o lado e voltou para o lado em que o fio estava. Uma grande quantidade de líquido vermelho esguichou para cima molhando o corpo dela e tingindo o objeto metálico. Um risada ecoou em meio as engrenagens e findou-se tão rápido quanto a alegria da mocinha, que voltou a sua posição entediada, apenas esperando o tempo certo para se banhar na morte de outros. Pandora vira o início daquilo tudo, e agora partilhava o final de cada um deles, entediada por vezes até que o sopro da morte lhe viesse avisar de sua próxima tarefa.

Imagem retirada de epilogue.net,galeria Alissa Rindels